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O Fator L


          O Sangue dos Lobisomens


Narrativas do folclore brasileiro propõem que a maldição dos homens transformados em lobo não é irreversível. Segundo o folclorista Câmara Cascudo, muitas histórias populares dizem que, para dar fim à sina dos lobisomens, é preciso feri-los, fazer seu sangue correr. Note-se que Cascudo fala em sangramento, não em lobicídio – não se cogita matar o lobisomem, pois a morte do lobo seria também a morte do homem.

            Isso nos dá a pista de que o que quer que seja que faz um ser humano virar lobo está em seu sangue. E sugere que pode existir, na ciência, algo que explique a licantropia da ficção, a metamorfose do homem em lobo.

            Partimos da hipótese de que o agente causador da transformação está no sangue e denominamos esse agente Fator L: Fator Lobisomem ou Fator Licantropia. O sangue de uma pessoa que for mordida por um lobisomem será contaminado por esse agente, que não sabemos se é orgânico ou inorgânico; porém, as moléculas do Fator L devem ter a capacidade de infectar a vítima e multiplicar-se, especialmente se encontrarem um ambiente favorável. Não sabemos a forma que tomaria essa multiplicação (se for algo como uma bactéria ou sabe-se lá que ser monocelular, reproduzir-se-ia por cissiparidade, por exemplo?), mas o local mais provável para se tornar seu hábitat é o plasma, um dos componentes do sangue que já costuma abrigar elementos causadores de algumas doenças.

Ora, se o Fator L infectar o plasma de nossa vítima, provavelmente levará algum tempo instalando-se e espalhando-se pela corrente sanguínea. E ficará dormente, latente... até a chegada da próxima Lua Cheia.



         A Lua e a Metamorfose
   
         Todos sabem que a Lua exerce um efeito de atração sobre todos os fluidos da Terra. A Lua Cheia atrai as águas, fazendo as marés subirem; influi até nos hormônios humanos e em várias funções fisiológicas, pois não é dito que é nas mudanças de fases da Lua que as mulheres tendem a dar à luz? Há inúmeras narrativas de parturientes que, diante da entrada de nova fase lunar, sentem a bolsa de água romper e entram em trabalho de parto.

            Imaginamos então que, ao nascer da Lua Cheia, o sangue será afetado pelo magnetismo luar. As moléculas do Fator L, que estiveram inativas no sangue,  virão à tona e se tornarão ativas. Isso causará não apenas seu aumento em número, mas sua atuação progressiva sobre os componentes do sangue.

Os glóbulos vermelhos constituem mais da metade dos elementos que formam o sangue e, portanto, é provável que o Fator L se una a eles para causar a transformação do humano em lobisomem. Ao subir da Lua Cheia eles se tornarão “glóbulos L-fatorizados” e, pelo sistema crculatório arterial, levarão a todo o corpo o agente da mutação, assim como levam o oxigênio.

Esse processo de mutação, atingindo todo o corpo humano irrigado pelo sangue arterial, fará  a as células da epiderme se transformarem em pele animal, coberta de pelos. Tornará o bípede um quadrúpede, modificará sua face e fará com que seu metabolismo anseie por alimento. De preferência, um alimento rico em proteína. Carne. Que pode, ou não, ser humana... 

A Superforça e O Fator de Cura
  
Consta nos mitos e lendas que a metamorfose do homem em lobo lhe atribui superforça e um fator de cura extraordinário diante de ferimentos – extetuando-se quando eles são feitos pela prata, é claro..

A existência de uma força física considerada sobrenatural é plausível se levamos em conta a ação das glândulas supra-renais. Toda vez que um  corpo é submetido a uma situação de estresse, essas glândulas produzem o hormônio adrenalina, também chamado epinefrina, que entra na corrente sanguínea e aumenta os batimentos cardíacos e o fluxo do sangue, preparando o corpo para grandes esforços físicos.

Esse hormônio atua também ao diminuir a sensação de dor, pois estimula a contração dos vasos sanguíneos. Tudo isso causa um aumento de força no lobisomem e faz com que ele seja mais resistente à dor, graças ao excesso de adrenalina derramada no sangue do lobo. Além desse efeito anestésico da adrenalina, os ferimentos recebidos durante a metamorfose seriam curados com rapidez, gerando o chamado “Fator de Cura”.

Isso deve ocorrer porque o Fator L também aumentará o índice dos glóbulos brancos e o tamanho das plaquetas no sangue. Os glóbulos brancos, ou leucócitos, atacam as infecções que afetam o corpo humano criando anticorpos. Naturalmente, no lobisomem eles se tornarão verdadeiros superanticorpos e, em grande número, atacarão qualquer corpo estranho, talvez pela fagocitose – ou seja, engolindo o invasor. Seja qual for a técnica usada, irão  destruí-lo. Uma bala de revólver, por exemplo, seria cercada por esses superanticorpos e rapidamente expulsa.

A ação das plaquetas, responsáveis pela coagulação e fechamento de feridas, ocorrerá quando elas se multiplicarem com a ajuda do fator L e provocarem a cicatrização rapidamente. Ao se tornar homem mais uma vez, o lobo terá seus ferimentos curados.
            Com o baixar da Lua no horizonte, sua ação magnética decairá e o Fator L entrará em fase de diminuição, voltando a ficar dormente no plasma do sangue do homem-lobo: será o fim do efeito mais visível da Licantropia, a mutação.

A Plasmaferese

Temos então uma hipótese bem plausível: de que, se as moléculas do Fator L estão no plasma, podem ser extraídas com a filtragem do sangue.

Existe um processo médico chamado Plasmaferese, na verdade um método terapêutico utilizado para eliminar anticorpos produzidos por doenças autoimunes (como o Lúpus, a Miastenia Gravis, a Síndrome de Lambert-Eaton ou a de Guillain-Barré). Semelhante à diálise, a plasmaferese remove o plasma do paciente através de um separador celular que centrifuga o sangue ou o faz passar por uma membrana com poros ultrafinos, pelos quais somente o plasma pode passar. Funciona “através de uma máquina processadora de sangue, por um cateter de duplo lúmen previamente inserido em uma veia calibrosa do paciente, será feita a centrifugação e retirada de plasma e concomitantemente a reposição de solução de albumina ou plasma fresco congelado”. [1]

 Essa filtragem do sangue remove substâncias nocivas do plasma; porém é considerada difícil e cara, e habitualmente é reservada aos indivíduos com doenças graves que não responderam ao tratamento convencional. Para ser útil, deve remover o componente sangüíneo indesejável mais rapidamente do que ele é produzido pelo organismo; e só se deve repeti-la quando estritamente necessário, porque os grandes desvios líquidos entre os vasos sanguíneos e os tecidos que ocorrem quando o sangue é removido e retornado podem acarretar complicações em indivíduos que já se encontram doentes. Ajuda no controle de algumas doenças, mas, em geral, não consegue curá-las.

 Parece, então, o processo ideal para a retirada do Fator L do sangue é mesmo a plasmaferese, já que retiraria o plasma infectado pelo Fator L; ainda podem restar moléculas dele, mas a ideia é de que diminuam tanto que não consigam mais efetuar a mutação do homem em lobo. Embora essa filtragem seja muito difícil a um lobisomem comum obter: como diria Daniel Lucas, como entrar num laboratório ou hospital, na primeira noite de Lua Cheia, e pedir (ou rosnar) aos enfermeiros para que retirem o sangue do lobo e o filtrem?...




[1] http://www.unimedara.com.br/_gravar/download/d21fa98167005520188082ecec72c38e.pdf

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